Nova aliança do G8 atinge e usurpa terra e água de 50 mil pessoas em Moçambique

ADECRU| 2 March 2015

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Terra usurpada pela Mozaco, Comunidade de Natuto, Distrito de Malema
Nova aliança do G8 atinge e usurpa terra e água de 50 mil pessoas em Moçambique

Nampula, 2 de Março de 2015 − 10 mil famílias camponesas são vítimas da mais agressiva e imperialista iniciativa do Grupo dos oito países com economias consideradas mais desenvolvidas do mundo (G8) no continente africano. Lançado em Abril de 2013, a Nova Aliança para Segurança Alimentar e Nutricional já lidera um dos maiores processos de penetração, usurpação e concentração de terras e controlo das principais regiões geoestratégicas e agroecologógicas de Moçambique, detentoras de mais de 70% das potencialidades das riquezas naturais e do subsolo do país, situadas nos Corredores de Desenvolvimento da Beira, Nacala e Vale do Zambeze para torna-los em regiões de fluxo de capitais e exportação de produtos primários para os mercados globais.

A Accão Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais, reconhecida por seu importante trabalho no engajamento democrático e inserção produtiva dos diversos actores na construção de uma agenda soberana de desenvolvimento, tem vindo a monitorizar e documentar o processo de entrada no País da Nova Aliança no período 2013-2015, que mostra os impactos provocados, a estratégia do avanço da Nova Aliança sobre os sistemas produtivos e pluractivos dos camponeses, a estratégia do avanço da Nova Aliança sobre os territórios das comunidades e a emergência de movimentos de contestação e resistência das Comunidades e das famílias camponesa.

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Machamba de camponeses que a Mozaco pretende usurpar para dar lugar a produção de soja, Comunidade de Natututo, Distrito de Malema
A geografia e mapa de usurpação e conflitos de terras ao longo do chamado Corredor de Nacala pela ADECRU mostra que a empresa Mozambique Agriculture Corporation (Mozaco), integrante da Nova Aliança do G8 para Segurança Alimentar e Nutricional em África, usurpou 2.380 hectares de terra pertencentes à mais de 1500 famílias camponesas da comunidade de Natuto, aldeia de Rucha, Posto Administrativo de Canhunha, Distrito de Malema, na província nortenha de Nampula para dar lugar a produção de soja em larga escala. Na mesma comunidade, a Mozaco pretende expandir a sua área para 20.000 hectares, o que atingirá, adicionalmente, à mais de 4500 famílias camponesas. A estas famílias juntam-se igualmente outras 4 mil da Comunidade de Namipaca, Localidade de Nioce, Posto Administrativo de Canhunha, onde a Mozaco pretende ocupar 10 mil hectares de terra para produção de soja. Caso esta tentativa de expansão iniciada em Novembro de 2014 se efective, serão cerca de 10 mil famílias atingidas apenas no Distrito de Malema pela Mozaco,  totalizando um universo de 50 mil pessoas.

A ADECRU apurou que a Mozaco é uma empresa criada em 2012 através de uma parceria entre a sociedade de investimentos do Grupo Espírito Santo (Rioforte) e o grupo moçambicano João Ferreira dos Santos (JFS), fazendo parte do lote das empresas integrantes da Nova Aliança do G8 para a Segurança Alimentar. Vale lembrar que a Rioforte é uma empresa com sede em Luxemburgo, que foi criada em 2009 como veículo para os activos não financeiros do Grupo Espírito Santo e que, em virtude do escândalo financeiro deste grupo, a Rio Forte foi colocada no grupo dos activos tóxicos do BES, os quais por deliberação do Tribunal Comercial de Luxemburgo em Outubro de 2014, devem ser liquidados e os fundos usados para pagar aos credores vítimas dos esquemas fraudulentos do BES.

No relatório da Agência de Desenvolvimento dos Estados Unidos da América (USAID) de 2014, intitulado Sepeed Report, paradoxalmente, a Mozaco foi considerada um caso de sucesso no progresso da Nova Aliança do G8 em Moçambique, ocultando deste modo e de forma intencional, a usurpação dos 2.380 hectares destinados a produção da soja, com acções concretas em curso para sua expansão para cerca de 20.000 hectares.

Trabalhamos nas nossas machambas desde o tempo colonial, muitas delas estão na área adjacentes da machamba do Morgado o antigo colono que explorava cerca de 1.000 hectares, que depois passou para a Unidade de Namele, uma empresa estatal. Depois de 30 anos vem a Mozaco e nos escorraça das nossas terras, é para irmos aonde? Moçambique é nosso e não dos portugueses, não podem nos expulsar das nossas terras como se fossemos cabritos”, disse à ADECRU DG, pai de 5 filhos, de 59 anos de idade, natural de Natuto.

Militantes da ADECRU em Nampula apuraram que durante o período colonial parte da área em disputa entre a Mozaco e a comunidade de Natuto pertencia a um colono português mais conhecido por Morgado, que explorava uma área superior a 1000 hectares de terra destinados a produção de algodão e tabaco. Com a independência nacional alcançada em Junho de 1975 e no âmbito das nacionalizações, a área em questão passou a ser explorada pela Unidade de Namele, uma empresa estatal que produzia igualmente tabaco e algodão.

Com a intensificação da chamada “guerra civil”, por volta de 1989 a Unidade de Namele foi encerrada. Porém as áreas adjacentes a machamba, quer no período colonial assim como durante o conflito armado eram exploradas pelos membros da Comunidade de Natuto e não só, que a partir de 1989 passaram a ocupar, igualmente, de boa-fé os pouco mais de 1000 hectares abandonados pela empresa estatal, o que a luz da lei de terras, Lei n.º 19/97, de 1 de Outubro, confere-lhes o Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT), em consonância com reconhecimento dos direitos consuetudinários plasmados nas alíneas a) “O direito de uso e aproveitamento da terra é adquirido por ocupação por pessoas singulares e pelas comunidades locais, segundo as normas e práticas costumeiras no que não contrariem a constituição” e b) “Ocupação por pessoas singulares nacionais que, de boa-fé, estejam a utilizar a terra há pelo menos dez anos” ambos do artigo 12.

Em virtude da violação dos seus direitos, em 20 de Fevereiro de 2014, famílias da Comunidade de Natuto redigiram uma carta ao Administrador do Distrito de Malema, enviada com conhecimento da então Governadora da Província de Nampula e do Director Provincial da Agricultura da mesma província. No documento a que a ADECRU teve acesso, as famílias reivindicam o seu direito de uso e aproveitamento das terras ocupadas pela Mozaco, incluindo o acesso ao cemitério cuja área foi igualmente ocupada pela empresa. No entanto, ao que a ADECRU apurou esta carta nunca chegou a ser respondida pelas entidades governamentais.

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Carta da Comunidade de Natuto enviada ao Administrador de Malema, com conhecimento da então Governadora de Napula e do Director Provincial da Agricultura.
A estratégia do avanço da Nova Aliança sobre os sistemas produtivos e pluractivos dos camponeses

A “Nova Aliança para a Segurança Alimentar e Nutricional em África” do G8 resulta de um acordo assinado por cerca de 40 estados e instituições financeiras e organizações multilaterais internacionais na cimeira do G8 de L’Aquila, Itália, depois de ter sido apresentada pela primeira vez pelo Governo dos Estados Unidos da América, sob a liderança do Presidente Barack Obama, em 2009, entrando efectivamente em funcionamento em 2012. Com esta iniciativa, o G8 argumenta que pretende cooperar com os Governos africanos para libertar 50 milhões de africanos da pobreza, 3.1 milhões dos quais em Moçambique entre 2012 e 2022. Com o referido acordo foi ainda estabelecido um suposto Programa Mundial para Agricultura e Segurança Alimentar do Banco Mundial estimado em US$ 20 mil milhões. Até Janeiro de 2015, 10 países africanos dos 20 previstos, já aderiram a Nova Aliança: Moçambique, Benim, Burquina Faso, Costa do Marfim, Etiópia, Gana, Malawi, Nigéria, Senegal e Tanzânia.

Por ocasião do lançamento da Nova Aliança em Moçambique nos dias 10 e 11 de Abril de 2013, a ADECRU emitiu o seu posicionamento, disponível em https://adecru.wordpress.com/2013/04/, contra esta iniciativa acusando-a de representar a “última e violenta fase de ajustamento estrutural do século XXI.” No mesmo documento lê-se ainda que “ a estratégia de entrada da ‘Nova Aliança em África’ assenta-se na captura do Programa de Desenvolvimento Abrangente da Agricultura de África (CAADP), com o objectivo de dar alguma legitimidade a acção do G8. Em Moçambique, essa intervenção é sustentada pelo argumento de alinhar o apoio financeiro e técnico agrícola dos países membros do G8 com as prioridades do Plano de Investimento do CAADP do País, referido como Plano Nacional de Investimento do Sector Agrário (PNISA), que respondem às demandas do G8 e suas respectivas corporações e não as prioridades de desenvolvimento soberano do país.”

Análises feitas pela ADECRU revelam que a “Nova Aliança” ao converter-se em Plano Nacional de Investimento do Sector Agrário (PNISA) captura e integra-se automaticamente em todas políticas do sector agrário tornando-se num documento central e operacionalizador da política agrária. A “Nova Aliança” obrigou o governo moçambicano a assumir 15 grandes compromissos de reformas do sector agrário extremamente perigosos para os camponeses, que tem conduzido a três grandes transformações favoráveis às corporações multinacionais: (i) Transformação dos mecanismos legais de aquisição da terra, traduzidos na flexibilização da atribuição do Direito de Uso e Aproveitamento de Terra (DUAT); (ii) Reforma da legislação nacional de sementes e fertilizantes, conhecida como harmonização das leis de sementes e fertilizantes da SADC, conferindo direitos exclusivos às multinacionais; e (iii) O avanço do agronegócio (empresas nacionais e estrangeiras) sobre os territórios das comunidades e os respectivos impactos.

A ADECRU está na posse de informações e evidências que indicam que a USAID e o Banco Mundial pressionaram e tentaram forçar o Governo de Moçambique e o extinto Ministério da Agricultura (MINAG) a flexibilizar a reforma do quadro legal sobre a terra vigente no país para que se introduzisse o arrendamento de terra e posteriormente a sua privatização sobre pretexto de melhorar a transparência e eficiência na administração e gestão de políticas agrárias e de terras. Na sequência desta pressão e temendo eventuais conflitos e convulsões sociais com consequências políticas que pudesse resultar de possíveis tentativas de alteração da lei da terra dada a sensibilidade da questão fundiária, os dirigentes do então MINAG viram-se obrigados encontrar um meio-termo. A solução encontrada foi uma medida administrativa, porém satisfatória face às exigências e imposições da “Nova Aliança” do G8, pelo menos temporariamente, evitando por agora outras acções de contestação e resistência das organizações camponesas, dos movimentos do campo e da sociedade que há mais de três anos protestam e denunciam o ProSavana. Para o efeito, emitiu um memorando interno decretando a flexibilidade na atribuição do DUAT a nível nacional com vista a reduzir o tempo entre 1 à 7 anos para entre 3 a 12 meses, o que constitui uma mudança radical nos procedimentos normais.

No âmbito da reforma da legislação nacional de sementes sabe-se que o Governo moçambicano comprometeu-se a reestruturar o seu sistema de sementes para permitir a produção e distribuição de sementes melhoradas, com particular ênfase em sementes híbridas, altamente dependentes de irrigação em grande escala e do uso de fertilizantes sintéticos e pesticidas. Isso levou a revisão da legislação de sementes através da revogação do Decreto n° 41/94, de 20 de Setembro, os Diplomas Ministeriais n°s 95/91 de 7 de Agosto, 6/98, de 11 de Fevereiro, 67/2001, de 2 de Maio, 171/2001 de 28 de Novembro e 184/2001 de 19 de Dezembro que é o Regulamento de Produção, Comércio, Controlo de Qualidade e Certificação de Sementes, cujo processo foi conduzido sem consultas às organizações da sociedade civil, organizações de camponeses e movimentos do campo.

Este foi dirigido unicamente pelo Governo de Moçambique e pela USAID, ignorando os sistemas de produção de sementes de camponeses que servem mais de 90% dos produtores, responsáveis pela produção de mais 90% de alimentos, com um contributo de cerca de 25 % do Produto Interno Bruto (PIB) e emprega 81% da população economicamente activa, sendo 60% mulheres. Outrossim, o Decreto n.º 12/2013, de 10 de Abril (Regulamento de Sementes) corporiza a introdução de mudanças substanciais à favor das empresas nos mecanismos de produção, comercialização e utilização de sementes pelo sector comercial e pela agricultura camponesa. Esta revisão da legislação de semente foi acompanhada pela adopção pelo Conselho de Ministros de Moçambique do Regulamento sobre Gestão de Fertilizantes, Decreto n.º 11/2013, de 10 de Abril.

Para a ADECRU, um dos principais e graves impactos da alteração desta legislação fomentada pela Nova Aliança é a retirada do subsídio estatal às sementes para os camponeses que consistia na disponibilização de sementes gratuitamente e em alguns casos a preços bonificados nos anos precedentes a campanha agrícola 2013/2014. Associado a este facto, através do artigo 47, do Decreto n.º 12/2013 (Regulamento de Sementes), o Governo autoriza empresas a operarem em Moçambique o direito de importação e produção de sementes Geneticamente Modificadas (GMO) segundo o estipulado em legislação específica. Em termos práticos, bastando a adopção de legislação específica de Uso da Biotecnologia, enquadrada na Nova Aliança, que está a ser discutida ao nível do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), Moçambique tornar-se-á num dos estados africanos utilizadores dos OGM´s aniquilando os sistemas seculares de produção e troca de sementes entre camponeses, assim como dar-se-á início a um ciclo de dependência e alienação dos camponeses pelas grandes corporações globais do agronegócio.

A estratégia do avanço da Nova Aliança sobre os territórios das comunidades

Informações colhidas por pesquisadores da ADECRU revelam que até Janeiro de 2015, cerca de 21 empresas integram a Nova Aliança em Moçambique, das quais 6 nacionais e 15 estrangeiras. Como forma de facilitar a aquisição de terras por estas empresas foi instituído ao nível do Centro de Promoção da Agricultura (CEPAGRI) uma unidade de assistência às empresas integrantes da Nova Aliança, cujos consultores foram contratados e pagos pela USAID. Associado a esta unidade, um conjunto de empresas e organizações internacionais promotoras de serviços de assistências às empresas foram concedidas financiamentos pela USAID, sendo um dos maiores expoentes a TechnoServe cujo mandato é de encorajar os camponeses a mudarem suas práticas agrícolas, fomentando a cultura de soja ao longo do Corredor de Nacala, estabelecendo “business linkages” entre estes e as empresas. Paralelamente a este processo, foram adoptados três programas de avanço pela USAID para cooptar os camponeses e impor transformações brutais, integrando supostamente os mais “competentes” na cadeia do agronegócio através de três sob programas nomeadamente: AgriFUTURO, Speed program e FinAgro, sendo este último muito contestado publicamente por camponeses do Corredor de Nacala, incluindo pela Direcção provincial da Agricultura de Nampula.

Foi dentro deste esquema que a Mozaco obteve um DUAT de 2.389 hectares de terra na Comunidade de Natuto de Natuto, Aldeia de Rucha, Posto Administrativo de Canhunha, Distrito de Malema.

“Tratando-se de uma antiga machamba estatal, oficiais governamentais corruptos ludibriam as comunidades alegando que estas ocuparam uma propriedade do estado e que este quer de volta as terras. Dado o desconhecimento da lei de terra, as comunidades não vêm outra alternativa a não ser abandonar as machambas que por lei às pertencem”, denunciou um dos militantes da ADECRU em Malema, para mais adiante acrescentar “temos estado a notar que essa tem sido a estratégia de entrega das terras as grandes empresas em todo Corredor de Nacala, visto que assistimos a mesma situação em Nacololo e em Meruto no Distrito de Monapo, onde igualmente antigas machambas estatais foram entregues a uma empresa de origem sul-africana para produção de soja, e as comunidades resistem a entrada da empresa”.

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Exemplo de um dos contratos de indeminizacao da Mozaco, por via da JFS, a uma das famílias atingidas no valor de 4800 Mt (120 EUR), pelas casas e culturas das machambas usurpadas
Em Outubro de 2012 cerca de 1500 famílias que tinham machambas na área da antiga machamba estatal foram retiradas pela Mozaco, incluindo 10 famílias que tinham suas residências na área, tendo estas recebido uma indemnização entre 3.000 Mt (US$100) a 9.000 Mt (US$ 200) cada. Eu “produzia na minha machamba desde 1991” até altura em que“técnicos dos Serviços Distritais de Actividades Económicas de Malema (SDAE) disseram-nos que devíamos  sair da terra do estado. E porque não tínhamos casa nesta zona também disseram-nos que não tínhamos direito a nada e consequentemente devíamos procurar machamba noutro lado”, relatou à ADECRU uma das camponesas vítimas da Mozaco, mãe de 6 filhos.

Usurpação de terra e água originam resistência da Comunidade de Natuto e de Namipaca em Malema

Na campanha agrícola de 2013/2014 a Mozaco decidiu expandir os seus campos de produção de soja em direcção a área habitacional da Comunidade de Natuto, alegando que ainda não tinha alcançado a sua concessão de 2.389 hectares. Para o efeito, segundo apurado pela ADECRU, no dia 30 de Abril de 2014 o Secretário Permanente do Distrito informou as famílias abrangidas que a empresa tinha o direito de ocupar as terras, tendo insistido na ideia de que as mesmas deviam abandoná-las para permitir o avanço daquele projecto. Entretanto, os residentes da comunidade de Natuto recusaram-se a acatar as ordens do Secretário Permanente Distrital em resistência a invasão e ocupação de suas terras.

No dia 28 de Junho de 2014, o Presidente do Conselho Municipal de Malema, juntamente com o Chefe do Posto Administrativo de Canhunha, reuniram-se com a comunidade reiterando que todos os membros da comunidade deviam sair da área para a outra margem do Rio Nataleia, instalando-se em Nholo (uma comunidade vizinha). “Disseram-nos que devíamos abandonar nossas casas, machambas, atravessar o Rio Nataleia e viver na outra margem para dar este lugar a Mozaco. Nós não aceitamos abandonar as nossas terras para dar a esses brancos. Disse uma mãe, muito agastada.

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Na imagem, algumas habitações e machambas que a Mozaco pretende ocupar, alegando estarem na área que foi concessionada pelo Governo a empresa
Dada a resistência das cerca de 4.000 famílias da Comunidade de Natuto, segundo informações apuradas pelos militantes da ADECRU no Corredor de Nacala, a Mozaco e as autoridades governamentais de Malema dirigiram-se a Comunidade de Namipaca, Localidade de Nioce, Posto Administrativo de Canhunha em busca de 10.000 hectares de terra adicionais, numa área habitada por mais de 4.000 famílias de camponeses que vivem nela à gerações de anos.

“O Secretário Permanente do Distrito veio cá no mês de Dezembro de 2014 e reuniu-se connosco. Disse que vinha nos informar que o candidato da FRELIMO ganhou eleições e agradecer a comunidade pelos votos. Por isso prometeu que iria construir uma escola, um hospital e reabilitar a estrada que dá acesso a comunidade, mas que tudo isso seria feito por uma empresa chamada Mozaco e que nós devíamos entregar 10.000 hectares a essa empresa. Disse também que nós teríamos emprego nessa empresa, mas quando perguntamos onde é que nós ficaríamos, ele disse que tínhamos que arranjar terras nas regiões vizinhas. Ao ouvir isso recusamos porque não queremos perder nossas terras.”Disse à ADECRU um dos líderes de Namipaca.

Em virtude da resposta negativa, o Secretário Permanente de Malema prometeu a comunidade de Namipaca que regressaria com o Administrador do Distrito para melhor discutirem o assunto. Na prática, as autoridades governamentais locais servem como um instrumento das empresas e das elites políticas de Maputo associadas à estes negócios, cujo papel é de ludibriar as comunidades para concederem milhões de hectares de terra e reprimir qualquer tipo de resistência que possa emergir.

Contactada desde Novembro de 2014, até da data do fecho do presente artigo, a Mozaco não respondeu os pedidos de entrevista enviados formalmente a esta empresa. Igualmente, a JFS accionista da Mozaco não respondeu iguais solicitações enviadas a esta empresa.

Dados analisados pela ADECRU revelam que no âmbito da Nova Aliança do G8 para a Segurança Alimentar e Nutricional foram efectivados negócios de terra com 5 empresas em Moçambique (Corvus Investments International, ENICA, Mozaco, Lozane Farms e Rei do Agro), até Dezembro de 2014, numa área total de 33.300 hecatres para produção de culturas voltadas para exportação, designadamente soja, banana, macadania, milho e girassol. Destes números, na campanha agrícola de 2013/2014 foram cultivados efectivamente 8.189 hectares por estas empresas, onde a soja representa cerca de 91% dos hectares produzidos.

No quadro do retorno e penetração colonial e imperialista do G8 no continente africano pós independências, 10 grandes companhias transnacionais ao abrigo da “Nova Aliança” aceleram o processo de controlo das cadeias de valor, por meio de mecanismos de manipulação e alienação das famílias camponesas. Neste sentido, sabe-se que cinco empresas entre as quais “Cargill, Competitive African Cotton Initiative – COMPACI, DADTCO, SABMiller,e Sunshine Nut Company estão a desenvolver projectos de agricultura sob contrato em Moçambique no âmbito da Nova Aliança com destaque para culturas de algodão, soja, milho, mandioca e castanha de caju. Outras 5 empresas nomeadamente: African Cashew Initiative – ACI, AGCO, Swiss Re, United Phosphorus (UPL)/Advanta  e Vodafone/Vodacom estão envolvidas no provimento de serviços que vão desde assistência técnica ao agronegócio, financiamento, seguros à agricultura e sistemas de comercialização. O avanço destas empresas conta com o forte suporte técnico e financeiro do Banco Mundial, USAID, JICA e TechnoServe.

Diante dos factos apresentados, a ADECRU denuncia o avanço da Nova Aliança para a Segurança Aliança e Nutricional sobre os territórios camponeses e das comunidades e repudia, com urgência e veemência, as graves violações da Lei de Terra e demais legislação aplicável. O Conselho de Coordenação Politico-Associativa da ADECRU convoca, deste modo, todos os movimentos de camponeses, ambientais e sociais, comunidades rurais, pessoas do bem e todo o povo moçambicano para uma acção urgente de mobilização para travar o ataque agressivo da Nova Aliança que de forma perversa já fez cerca de 50 mil vítimas.

O Conselho de Coordenação Politico-Associativa da ADECRU assume desde já o compromisso de recorrer a todos os meios legais nacionais e internacionais disponíveis para responsabilizar as empresas e os governos dos G8 responsáveis pela Nova Aliança. A ADECRU igualmente mantém-se firme e determinada a mobilizar e engajar todas as famílias atingidas num movimento popular de contestação, denuncia, resistência e luta em defesa da terra, recursos naturais e seus direitos em articulação e solidariedade com outros movimentos sociais, ambientais e campesinos nacionais e internacionais.

Nampula, 02 de Março de 2015
Conselho de Coordenação Politico-Associativa da ADECRU
ADECRU: Rua Abner Sansão Muthemba, Nr 34, Bairro da Malanga, Cidade de Maputo
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