Debate levado a cabo pelo Governo sobre o ProSAVANA é para impressionar japoneses e brasileiros

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Tema de Fundo | 28 Julho 2015

Debate levado a cabo pelo Governo sobre o ProSAVANA é para impressionar japoneses e brasileiros   

Escrito por Emildo Sambo  em

O controverso ProSAVANA, oficialmente lançado em 2011, está em implementação ignorando o processo de diálogo e auscultação pública e as recomendações e preocupações das Organizações da Sociedade Civil (OCS). José Pacheco, ministro da Agricultura e Segurança Alimentar, disse ao Parlamento, na quarta-feira (22), em resposta a uma das perguntas colocadas pela Frelimo que o projecto em causa “já apresenta resultados encorajadores” em várias culturas, tais como “milho, soja e mandioca”, o que deixa claro que os encontros que têm sido realizados no âmbito deste plano são apenas para impressionar os japoneses e brasileiros, grandes mentores da iniciativa.

As OCS têm confrontado o Governo com a informação de que o ProSAVANA está a ser executado de forma tirânica e não leva em conta as inquietações das populações dos lugares onde o mesmo está em curso, mas o Executivo negou sempre e argumentou que tudo não passava de um mal-entendido.

O ano de 20124, segundo as informações que têm sido tornadas públicas pelos mentores do programa, foi de harmonização das recomendações e preocupações identificadas durante o diálogo e a auscultação pública e que culminaram com aelaboração da versão zero do Plano Director para o Desenvolvimento Agrário do Corredor de Nacala. Porém, as declarações triunfalistas de José Pacheco deixam dúvidas sobre a seriedade do Governo em relação à sua articulação com as OCS no âmbito do plano com o qual se pretende resolver o problema da fome em Moçambique.

A informação que o ministro prestou na “Casa do Povo” é verdadeira mas é uma “vergonha” para o próprio Governo, porque não tem tido a coragem de assumir nas reuniões com OCS que o ProSAVANA já está em marcha violando uma série de direitos dos pequenos agricultores que representam pelo menos mais de 80% dos camponeses moçambicanos, segundo Clemente Ntauzi, coordenador executivo da Acção Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU).

De acordo com o nosso interlocutor, a postura do Governo não surpreendente, até porque mesmo a versão zero do Plano Director para o Desenvolvimento Agrário do Corredor de Nacala foi elaborada depois de muita pressão feita pelas OCS. Mesmo assim, o documento continua a não responder às expectativas deste grupo que advoga em prol das populações, sobretudo rurais, cujos direitos têm sido sistematicamente infringidos.

“Hoje existem tractores para este programa, adquiridos no âmbito de uma parceria entre o Governo de Moçambique e o Brasil, e eles (os veículos automóveis) não são para responder aos problemas dos pequenos camponeses. O ProSAVANA está orientado para o agro-negócio e não para o desenvolvimento do pequeno agricultor tal como se tem dito. O ProSAVANA arrancou muito antes da versão zero do Plano Director para o Desenvolvimento Agrário do Corredor de Nacala”, explicou Clemente.

Aliás, no programa em questão, elaborado pelo próprio Executivo, consta, na parte referente ao “Ano Meta, Estágios do Desenvolvimento e Crescimento Agrário”, que “a melhoria das condições de vida da população” tem como o ano meta 2030 e deve ser implementado gradualmente nas três etapas seguintes: “Fase I - Período de início: 2015 a 2020 – seis (6) anos, Fase II - Período de crescimento: 2021 a 2025 - cinco (5) anos, Fase III - Período de amadurecimento: 2025 a 2030 - cinco (5) anos”.

Considerando que “o Plano Director foi elaborado como um plano regional para a operacionalização do PEDSA, no Corredor de Nacala, os seus indicadores compreendem uma taxa de crescimento anual da agricultura de 7,0% no período entre 2015 a 2025 e de 6,0% para operíodo entre 2026 a 2030”.

Para José Pacheco, o plano que se propõe melhorar as condições de vida dos camponeses de 19 distritos do centro e norte de Moçambique, de onde surgem várias lamentações de pequenos agricultores que se queixam de expropriação das suas propriedades, já contribui para que “90% do frango comercializado e consumido na região norte”, seja “made in Mozambique” e a produção da mandioca aumentou de tal sorte que está a deixar de ser “essencialmente de subsistência” para se tornar numa fonte de renda dos camponeses na medida em que está a constituir matéria-prima para a indústria de bebidas alcoólicas.

Para Clemente, o projecto em causa “vai criar a insegurança alimentar e não vai resolver a penúria das famílias. Não se trata de um programa para criar meios de subsistência das populações”, mas, sim, está orientado para alimentar “o mercado internacional. A agricultura em Moçambique continua a base de desenvolvimento”; porém, carece de incentivos dos pequenos agricultores, pois “são estes que garantem a comida que é posta na mesa todos os dias nas nossas famílias”.

O ministro, que a 12 de Junho passado transformou uma auscultação que se pretendia pública num encontro para a exibição da sua insolência, ao ameaçar as pessoas a que se dirigia com as declarações: “qualquer obstáculo que apareça (contra o ProSAVANA) vamos atropelar e passar para a frente”, voltou, para além de nervosismo, a manifestar tamanha arrogância na altura de se pronunciar sobre o projecto em alusão.

Naquela quarta-feira, José Pacheco dirigiu-se ao pódio, ignorou todos os formalismos protocolares da Assembleia da República (AR), o que irritou particularmente a bancada da Renamo, e pôs-se a falar, em tom alto e de imponência, do ProSAVANA como um plano já em implementação, o que, a ser verdade, deixa transparecer que o Governo tem estado a fazer consultas públicas só para o “inglês ver”.

A pergunta da Frelimo visava perceber o “ponto de situação do programa” acima referido, “o seu impacto na vida das comunidades e na economia, em geral”. José Pacheco não respondeu satisfatoriamente à pergunta, ou seja, tudo o que ele disse não explica de que forma o ProSAVANA beneficia a população das zonas onde está em curso.

No evento de 12 de Junho, o governante disse ao auditório que ele próprio estava lá “na qualidade de membro do Governo da República de Moçambique”, para debater o polémico programa com o qual se pretende resolver o problema da fome no país, por isso, “quem estiver interessado venha, quem não se sente confortável ou não se sente enquadrado neste desafio de pormos os moçambicanos a produzir que se estabeleça onde se sinta confortável”.

Ao contrário do que dissera naquele encontro, no Parlamento, Pacheco vestiu outra capa e disse que os principais aliados e parceiros do Executivo no Corredor de Nacala “são os pequenos e médios produtores, avicultores e criadores de gado, que num processo de transformação gradual, de curto, médio e longo prazos, evoluirão de uma agricultura de subsistência para uma agricultura intensiva orientada para o mercado”.

O ProSAVANA “nunca fez, não faz e jamais fará a gestão, directa ou indirecta, de qualquer parcela de terra para a produção agrária ou para outros fins”, afirmou o ministro em clara resposta a organismos como a Acção Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU) e a União Nacional de Camponeses (UNAC), parte das organizações da sociedade civil que lideram as campanhas contra o programa, porque no seu entender tem um “impacto nefasto e devastador para milhares de famílias camponesas residentes no corredor de Nacala”, mormente por estimular a usurpação de parcelas de terra.

Refira-se que no Corredor de Nacala decorre também o Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Sector Agrário-PEDSA (2011-2020), o qual é operacionalizado pelo Plano de Investimento Nacional do Sector Agrário (PNISA), lançado em 2013 como um programa de investimento de médio prazo. Para se levar a cabo os dois projectos, o Governo estabeleceu seis corredores de desenvolvimento, nomeadamente: Maputo, Limpopo, Beira, Vale do Zambeze, Nacala e Pemba-Lichinga.
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